domingo, 15 de maio de 2011

Acerca de leitura e de leitores

Lionel Bellenger
Em que se baseia a leitura? No desejo. Esta resposta é uma opção. É tanto o resultado de uma observação como de uma intuição vivida. Ler é identificar-se com o apaixonado ou com o místico. É ser um pouco clandestino, é abolir o mundo exterior, deportar-se para uma ficção, abrir o parêntese do imaginário. Ler é muitas vezes trancar-se (no sentido próprio e figurado). É manter uma ligação através do tato, do olhar, até mesmo do ouvido (as palavras ressoam). As pessoas leem com seus corpos. Ler é também sair transformado de uma experiência de vida, é esperar alguma coisa. É um sinal de vida, um apelo, uma ocasião de amar sem a certeza de que se vai amar. Pouco a pouco o desejo desaparece sob o prazer.
Eu defino o bom leitor menos por sua relação com a leitura que pelo uso da linguagem escrita. Eu o defino mais pela produção de textos que pela quantidade de leitura, ou seja, é um indivíduo compelido a escrever para participar da resolução de problemas, do pensamento, da compreensão de si mesmo, dos outros, da realidade e dos caminhos da sua transformação. Nesse sentido, quem utiliza a escrita o faz não para se distrair ou para fugir das dificuldades; ao contrário, a escrita é para ele um meio de se defrontar com essas dificuldades e poder superá-las. Digo isso pensando especialmente na literatura, que é, sem dúvida, a coisa mais gráfica que existe - o meio que os homens se dão para compreender a condição humana, expor seus limites e tentar fazê-la evoluir. É preciso encarar a literatura como atividade extremamente séria, e questionar o fato de sempre apresentarmos a leitura ao não-leitor como alguma coisa relacionada com o prazer, com a distração, enquanto as pessoas que leem o fazem por necessidade. Mesmo que seja por uma necessidade metafísica.

Um comentário:

  1. LER. Como essa palavra soa doce aos ouvidos!

    Concordo plenamente com o que foi exposto, Vastí!

    Vale ressaltar que o essencial seria o incentivo à leitura desde a infância, pois é nessa fase que os hábitos se formam.
    Nesse contexto, é importantíssimo o papel educador dos pais e professores na construção do hábito de ler por prazer, não por obrigação.

    Através do exemplo, vidas podem ser mudadas. Através da leitura, seres humanos podem se redescobrir...
    E dessa redescoberta nascerão pessoas melhores, com consciência crítico-reflexiva aguçada e capazes de modificar o contexto em que vivem.

    (Adorei o post! É sempre um prazer visitar o Idiossincrasia.)

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