sábado, 27 de agosto de 2011

Amigas de Infância

Houve um tempo na vida em que quis voltar aos lugares onde me senti feliz. Foi quando descobri que a memória é seletiva, ao mesmo tempo em que é traiçoeira - voltar não apenas me revelou que a felicidade é um bem que não pode ser resgatado, como muitas vezes aumentei seu tamanho para acobertar as tristezas que sofri e que por algum motivo jazem ocultas nalgum recanto de minha alma.
Somos diversos, e nessa teia de emoções em que se divide nossa memória ora jogamos luzes em emoções irrecuperáveis, ora condenamos à sombra tristezas mal resolvidas. Sim, a tristeza é uma emoção que requer resolução. Diria mais: exige! Impensável viver com ela à solta pelos cantos de nossa alma, qual um macaco alucinado a desarrumar os móveis de nossa casa, nossas ideias e esperanças, nossos sonhos e desejos. 
Ao contrário do que acreditei por muito tempo, a tristeza não me afasta da felicidade. As duas são tão opostas quanto necessárias, vivem grudadas como amigas de infância. Não sabem viver sozinhas, não conseguem sair sem companhia e se dão ao luxo de prescindir do dom da independência...
Acertar é Humano - (Pelegi)
Infortúnio é ser e estar indiferente. É quando a emoção não nos importa, é quando viver se torna ato burocrático - fugimos dos extremos, acreditando que nos aproximaremos do equilíbrio e da harmonia, da calmaria e da quietude. A felicidade carece da tristeza para se realizar, como a tristeza é a paga que a vida nos cobra pelos desvios cometidos. Mas ao invés de castigo, ela é bênção. Ao contrário de punição, ela é desafio.
A indiferença, como tudo o mais que nos afasta da emoção, é a recusa do descobrir-se, é a repulsa à felicidade como processo evolutivo. É o engano traiçoeiro de que podemos, a qualquer momento, fechar as portas do coração para o mundo e ignorar o que se passa além de nosso umbigo. É a ignorância de nossa incompletude.
Somos vários, somos muitos, e graças a isso somos unos. Na coragem generosa de se abrir para o outro é que conseguimos nos aproximar do que somos. O homem não pode ignorar quem o circunda, como o navegante não pode evitar a tormenta. Somente a intensidade da vida nos permite realizar nossa síntese.

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