sexta-feira, 6 de janeiro de 2012

Informação, Ciência e Sabedoria

Reflexão de Emilio Lamo de Espinosa
[...]Sem dúvida, a sabedoria de que dispomos não é hoje muito maior da que tinham Confúcio, Sócrates, Buda e Jesus. Não parece ter melhorado muito nos últimos três  mil anos e, o que é pior, não sabemos bem como produzi-la. Tampouco diria que retrocedeu, mas sim que é quase uma constante que tem variado pouco ou nada nos últimos séculos. Razão pela qual a leitura de Ética a Nicômaco, de Aristóteles; a De constantia sapientis, de Sêneca, o Sermão da Montanha, de Jesus de Nazaré, têm hoje tanto valor como quando foram publicados. Enquanto que (como dizia Whitehead) a ciência progride esquecendo seus clássicos, e ninguém que deseje saber ótica lê hoje a lei de Newton. Mas se tivéssemos progredido em sabedoria como temos progredido em conhecimento, esses velhíssimos textos morais careciam de valor, como carece de valor atual o Tratado elementar de Química, de Lavoisier.
E mais ainda. Pois se bem é certo que a ciência carece de sabedoria, entretanto se autodefine - e é aceitada quase sempre - como única forma de saber válida. Como já assinalara Thorstein Veblen, em 1906, no primeiro texto de sociologia da ciência, "o sentido comum moderno sustenta que a resposta do científico é a única autêntica e definitiva". Pode ser, mas há a maldita casualidade que não responde, nem pode responder, às perguntas mais importantes. Não outra coisa dirá Habermas muito mais tarde: "Cientificismo significa... a convicção de que não podemos compreender a ciência como uma forma de conhecimento possível, senão que devemos identificar melhor conhecimento e ciência".
Mas nessa medida, na medida em que aceitamos, erroneamente, que a ciência é o único saber válido, ela mesma se transforma num dissolvente de todo outro saber alternativo possível, e, portanto, em dissolvente de todo saber de finalidades, em dissolvente da escassa sabedoria de que dispomos. Com o resultado paradoxal de que cada vez sabemos mais o que podemos fazer (cada vez podemos fazer mais coisas), mas sabemos menos o que devemos fazer, pois inclusive a pouca sabedoria de que dispomos a menosprezamos. Certamente, invenções sem fim, sem finalidade, sem objetivo. Assim, dando um exemplo, sabemos que podemos clonar seres humanos; mas quando e por que é razoável fazê-lo?
Vivemos, pois, inundados de informações, com sólidos e eficazes conhecimentos científicos, mas desprovidos quase por completo de sabedoria. Suspeito que Eliot teria toda a razão e nosso problema é que não somos capazes de produzir sabedoria, ao menos ao ritmo no qual produzimos conhecimento.
Em 1934, em seu poema A rocha, o poeta T. S. Eliot escreve: "invenções sem finalidade, experiências sem finalidade, nos faz em conhecer o movimento, mas não a quietude, conhecimento da palavra, mas não do silêncio, das palavras, mas não da Palavra". E continua: "Onde está a sabedoria que perdemos com o conhecimento? Onde está o conhecimento que perdemos com a informação?" Quando certamente vivemos inundados de informações, com conhecimentos crescentes, mas com a mesma sabedoria de três mil anos, por hipótese, não tem sentido comentar esta profunda intuição.
Pois, certamente, informação, conhecimento e sabedoria são três modos de maneira de conhecimento, mas de alcance e desenvolvimento muito diferentes.

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