domingo, 16 de março de 2014

Ler e escrever

Durante a minha adolescência sempre escrevi diários nos quais procurava não só registrar meus sonhos ou meus medos mas também minhas impressões sobre a vida e as pessoas que me cercavam.
Quando li O Diário de Anne Frank compreendi que escrever diários vai além de tecer comentários sobre amenidades, significa sobretudo uma autoajuda e a visão despojada, verdadeira daquilo que vivemos. Em seu diário, Anne Frank, uma adolescente judia, faz-nos sentir o que é ser vítima de preconceitos e revela o seu dia a dia em cativeiro no período em que seu corpo e sua mente passavam por significativas transformações.
Experiências assim precisam ser repassadas para que o mundo não silencie diante de tais fatos. Alguém já disse que “o ser humano é capaz de elevar-se à altura das estrelas do céu, mas também descer aos mais profundos e obscuros abismos do mar”. A determinação e a tenacidade de um povo diante da ameaça de extermínio em benefício da ideologia de purificação racial justificam a afirmação. Conhecer a história de Anne Frank é ir além de uma história comum de adolescente.
Nessa fase da minha vida havia também uma busca de identificação com alguma personagem. Isso ocorria de forma natural. Lembro-me agora de que me identificava com Olívia de “Olhai os lírios do campo”; as longas cartas que escrevia a Eugênio e que nunca as enviava revelavam uma pessoa simples, mas determinada, que sabia administrar bem a insegurança e ambição de seu companheiro. Desenvolvi o hábito de escrever, às vezes criando situações de conflitos, outras registrando protesto, indignação ou desencanto.
Confesso, porém, que havia muito mais inspiração quando estava triste. Há algum tempo, li em algum lugar, que os grandes escritores e poetas devem ser tremendamente tristes, pois é sempre a tristeza a principal fonte de inspiração. E pensar que poderíamos estar privados de tanta beleza...
Desdêmona soube muito a respeito de Otelo analisando os livros que ele lia e as anotações que fazia às margens das páginas. Ela utilizou esse recurso quando foi forçada a ficar longe do marido quando de sua ida à ilha de Chipre, logo após o casamento dos dois, a fim de enfrentar uma grande batalha. Desdêmona acreditava que isso seria um mecanismo funcional para se conhecer alguém.
Bem, sempre acreditei também que onde existem livros residem também o conhecimento, a sabedoria e o amor. Toda leitura propõe um grande desafio: a descoberta do conteúdo latente que subjaz ao conteúdo manifesto.

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