domingo, 1 de fevereiro de 2015

Em compasso de espera...

A chuva fina e persistente é o cenário para os pensamentos que se encadeiam enquanto a espera acontece. A tolerância precisa fazer parte das virtudes que são construídas ao longo da vida porque ninguém nasce suficientemente virtuoso. O desenvolvimento dessa linha de raciocínio é coerente, é prudente, é oportuno até o momento em que outro fio é puxado dessa meada. É hora de desatar os nós que foram dados; atribuir-lhes significados até então encobertos pelo véu da comodidade, da suposta naturalidade.
Talvez o fato de amiudemente viver momentos de expectativa em situações desde as mais corriqueiras às de importância mais acentuada, haja uma tomada de consciência de que é fundamental a reflexão acerca desse estado. Enquanto se espera, eis a oportunidade de fazer conjecturas, de analisar, de ponderar, de mensurar o significado dessa espera interminável pelo menos em alguns aspectos, mediante as constatações que se apresentam de forma tão clara.
Não há como deixar de esperar, é verdade. Como diz o poeta, por um ou por outro itinerário. Há, porém, circunstâncias que poderiam ser diferentes não fossem outros fatores preexistentes: justamente os nós que foram se acumulando. Desatá-los – e precisa que isso seja feito um a um – demanda uma enorme disposição, pois se constitui um desafio refazer uma trajetória há muito percorrida. Parte desse roteiro já não é mais possível seguir porque os espaços foram tomados. Mas talvez fosse possível realizar a façanha de recuperação, pelo menos em parte, desse território. É preciso redesenhar o mapa mediante uma metódica análise.
No processo de reflexão eis que ocorre uma constatação – entre várias: a certeza de que, em primeiro lugar, é preciso que a tolerância seja exercitada consigo mesmo para não sucumbir ao resultado desastroso de uma autoavaliação rigorosa demais. Se determinadas coisas acontecem é porque existe a permissão do próprio indivíduo para tal, e é inevitável o risco de atribuir a si próprio a responsabilização dos fatos. Afinal, quem é o sujeito da ação de atar as duas pontas de um fio?
O grande desafio que se impõe é justamente encontrar a disposição necessária para iniciar um longo e doloroso caminho de volta, se não ao ponto de partida que seja ao menos ao lugar mais próximo dele, e tentar um outro jeito de seguir sem deixar para trás os mesmos ou outros tantos nós. Diante do óbvio, o pensamento que surge é desconcertante: é bem mais fácil permanecer no estado de inércia que, mesmo causando um imenso desconforto, não exige mudanças, não implica riscos. É bem verdade que as mudanças têm um caráter assustador, o que pode causar um efeito paralisante.
Ao tentar redesenhar o mapa, tornam-se nítidas as marcas da hesitação, das paradas, dos recuos e avanços reveladores de conflitos que permearam as decisões. Enquanto o mapa é redesenhado, outro compasso de espera é acionado no momento presente. O sinal é o olhar distante que revela habitar outras paragens. O tempo que duram tais abstrações não pode ser mensurado. A chuva fina ainda persiste.

Das constatações passa-se às conjecturas. Às vezes, nenhuma delas consegue tomar corpo porque, mesmo momentaneamente, aquela espera acaba e começa uma etapa de atividades até que outro momento de espera aconteça de novo. A impressão que se tem é que a espera é o todo fragmentado de intervalos em que acontece uma ou outra coisa.

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