Feliz é o mortal
que presenciou os Mistérios Eleusínios. Abençoados são seus olhos que os viram,
pois após a morte a jornada da sua alma será diferente daqueles que não foram
iniciados.
Homero
Homero
Os Mistérios Eleusínios constituem o
segredo mais bem guardado do mundo antigo. Originários de Creta como um
festival de outono dedicado à deusa Deméter e reservado somente às mulheres,
eles foram expandidos e abertos a todas as pessoas se fossem adultas, falassem
grego e não tivessem cometido nenhum crime. Iniciados na metade do segundo
milênio a.C., os Mistérios Eleusínios perduraram por quase dois milênios sem
que ninguém revelasse nada a respeito dos rituais e das iniciações. O pouco que
se sabe foi divulgado pelos comentários literários, pelas referências
históricas ou nas difamações cristãs sobre as práticas pagãs.
A palavra Eleusis simbolizava “O lugar da chegada feliz” e deu origem ao
termo “Campos Elísios”, sinônimo do paraíso pré-helênico. A palavra Mistério
tem como raiz a palavra mueín, que significa “fechar”, tanto os olhos quanto a
boca, ressaltando a obrigatoriedade do segredo e do isolamento durante a
iniciação.
Os candidatos deveriam submeter-se a uma iniciação durante os Mistérios
Menores, realizados na proximidade do equinócio da primavera, para poder
participar dos Mistérios Maiores, realizados na proximidade do equinócio de
outono. Desconhece-se a verdade sobre esta iniciação, sabendo-se apenas que
incluía testes de coragem e práticas ascetas.
Os Mistérios Maiores eram celebrados
a cada cinco anos e tinham duração de nove dias. Os candidatos chegavam a
Atenas vindos de todas as partes do mundo helênico e romano. No primeiro dia,
reuniam-se para atender às chamadas dos sacerdotes e receber suas instruções.
No segundo dia, purificavam-se mergulhando no mar e fazendo as primeiras
oferendas (leitões). O terceiro dia era dedicado às cerimônias e oferendas
oficiais em benefício da cidade de Atenas e do povo grego. No quarto dia,
conhecido como Asklepia, novas purificações eram feitas em homenagem a
Asclépio, o deus da cura. No quinto dia, dava-se início à procissão que
percorria os 32 km que separavam as cidades de Elêusis e Atenas. As
sacerdotisas carregavam os objetos sacros, purificados no mar, em grandes
cestos chamados Kista. Os iniciados vestiam túnicas brancas e cantavam,
dançavam e invocavam as divindades, cujas estátuas eram levadas em carruagens.
Nos limites da cidade de Elêusis,
figuras mascaradas encenavam parte do mito de Deméter expondo, por meio de
sátiras e deboches, os vícios, erros e defeitos humanos. Dessa forma,
esperava-se que os velhos Eus morressem e dessem lugar à renovação. Ao cair da
noite, o jejum de três dias terminava e havia uma grande festa do lado de fora
do Santuário. O sexto dia era reservado ao descanso, à purificação, ao jejum, à
introspecção e ao silêncio.
Quando as primeiras estrelas
apareciam no céu, os iniciados tomavam o Kyklon, bebida sagrada preparada com
centeio fermentado e hortelã, e entravam no santuário de Telesterion.
Desconhecem-se os rituais ali praticados. Sabe-se somente que havia três
estágios: a iniciação, em uma gruta subterrânea, em que os iniciados passavam
por provas e testes; a morte simbólica, em que os iniciados “renasciam”, sem
mais temer o fim da vida física por terem “visto” a continuidade de jornada da
alma; e a encenação do mito de Deméter e Perséfone. Nesse momento,
reproduzia-se a busca de Deméter por sua filha Perséfone, raptada por Hades,
deus do mundo subterrâneo, festejando-se, ao fim, sua volta à vida na Terra,
após os rigores do inverno simbolizando sua ausência.
O fim das celebrações era marcado
pelo sacrifício de animais, celebrando com danças e cantos o último gesto
ritualístico dos sacerdotes: o derramamento de água sobre o chão, invocando a
chuva para conceber a vida na Terra. Esse ato simbólico revelava o profundo
simbolismo dos Mistérios de Elêusis – o casamento sagrado da chuva celeste com
a terra fértil e receptiva para conceber o filho, representado nos grãos dos
cereais. Para os iniciados, que viviam da terra e de seus ciclos e estações, os
Mistérios representavam a confirmação sagrada de que a morte era seguida do
renascimento, assim como a vegetação morria no outono e renascia na primavera,
acordando de um sono profundo, por vezes comparado à própria morte.
Adaptando
o mito de Deméter e Perséfone à nossa realidade, podemos melhor compreender a
necessidade dos rituais de iniciação. Ao proporcionarem a visão dos medos,
limitações e defeitos que restringem a evolução de nossa alma, os rituais apontam
para a possibilidade de uma morte egoica que levará a uma renovação
transcendental. As mulheres podem encontrar no mito de Perséfone um exemplo de
coragem para descer ao mundo subterrâneo de seu inconsciente, atravessar as
sombras e emergir para a luz.
Mirella Faur
Parabéns adorei!
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